Caminhar... (Profa. Lúcia Peixoto)


Palavras...

é Arte & Poesia


Caminhar...

Há muito estou a caminhar

Há tanto tempo que é impossível precisar

De onde sai?

Onde quero chegar?

Muitas vezes pensei em parar

Mas o horizonte está sempre a me desafiar

O Tempo me levou muitos calçados

Foram as primeiras alpargatas

O tênis bamba

Os chinelos de borracha

As sandálias de salto alto

Descalça sigo a desviar das pedras

(São tantas pela estrada)

Em busca da areia macia

Da grama orvalhada

Quando cruzo com estradas asfaltadas

Poupo meus pés e abro minhas asas!


Eu mulher!

47 anos de uma vida feminina (Já se passaram 5 anos)

Passos lentos e apressados

Equilibrando-me no fino fio que é a vida

Menina franzina (Lá na roça) Despertava com a Aurora

Fixava o olhar no horizonte

Perdia-me toda nos raios do sol nascente

E quando moça faceira tardava a dormir

Sempre a espreitar os mistérios do Crepúsculo

Ah! Quantas cantigas de roda

Quantos poemas de amor

Quanto riso, quantas lagrimas

Forjaram-me no chão batido da fabrica

8 horas de labuta diária

A marmita quase sempre meio que fria

O salário menos que mínimo, visto tudo o que vinha descontado

Os descontos era coisa que ninguém entendia

Chamaram o sindicato para explicar

E lá veio a companheira com carro de som

Voz de quem sabia o que falava

(dizem que hoje já não é mais a mesma)

Mas naquele dia vi o Bom Retiro parar

Costureira de braços cruzados

Patrões Judeus, Coreanos, Brasileiros tiveram que explicar!

E a companheira que falava bonito no microfone

Disse que no dia seguinte seria 8 de março

Dia Internacional da Mulher

Dia de celebrar a luta das operárias queimadas

Um arrepio de indignação diante da história narrada

Foi então que assustada ouvi, meu grito de Não!

Não mais escrava de um sistema nefasto!

Não a exploração da minha classe!

Não!

Não fui mais uma menor escravizada

Com 16 anos me fiz mulher operária sindicalizada!

Nos 31 anos seguintes

Comi muito ovo frito na marmita mal esquentada

Fui “amassada” Em ônibus coletivos lotados

Atrasei o crediário das Casas Bahia

Tive meu nome protestado

Casei, separei, engravidei, pari... amei!!!

Estudei, me formei professora

Passei em concurso público

Me estabilizei

E junto essas letras mal rimadas

Pra dizer sou mulher de luta

Mereço Flores, chocolates, respeito e dignidade


Cá estou...

E cá estou a ruminar

Quarenta e sete anos vividos

Os primeiros lá na roça

Plantando rosas

Colhendo cenouras

Deitada no gramado

Lendo história que as nuvens desenhavam

Rabiscando corações nos troncos de árvores.

Aos quinze pintando a cara

Caminhando contra o vento

Falando de flores e derrubando presidente.

Me fiz semente... Plantei estrelas

Vesti vermelho

Me auto flagelei

Puberfei a puberfose me metamorfosei!

Preludiei o Apocalipse

Recriei a criação

Sangrei na Cruz por Paixão

Renasci na manjedoura

Sem teto, Sem terra fiz-me multidão

juntei-me a outras bocas famintas

Juntos aprendemos a dizer não!

Não a injustiça, não a opressão!

Os sonhos que antes sozinha eu sonhava

Tornaram-se projetos de realizações.


A Aurora da minha vida

Saudades da minha terra...

Que súbita ousadia é essa?

Quero dialogar, brincar num leve parafrasear

Os oito anos de Casimiro de Abreu...

Ah que saudades que tenho...

de ouvir o galo cantar

Os cachorros anunciando o voo livre da aurora

e a meninada acordando de pé no chão, dançando sobre o orvalho...

Saudades daquela vida franciscana antes dos meus oito anos

Lá no noroeste paranaense onde eu, menina peralta, sonhava os primeiros versos de ciranda...

a sombra das bananeiras, debaixo dos laranjais!

Saudades da aurora da minha vida!

Aquela tarde de verão chuvoso

meu uniforme escolar

a camiseta de algodão branco

molhada e transparente... meu corpo de menina moça

os olhares daqueles rapazes

a pasta escolar colada ao peito como um escudo protetor

de repente ainda com a chuva caindo aquele pôr-do-sol

O Arco Íris...

Tirei os sapatos (congas azuis desbotados)

senti meus pés afundar na lama

soltei a pasta que me acorrenta

corri feliz pela estrada de terra batida em meio aos cafezais

e nunca mais parei aquela carreira...

seguimos eu e o Arco íris vida a fora

brincando de esconde esconde

Hora ele batendo cara ora eu!


Diário Virtual!

Quando menina também tive um diário

Guardado a sete chaves

Onde escrevi meus primeiros versos

Declarações de amor eterno!

Sonhos, projetos, medos...

Meu eu secreto que o tempo absorveu

Hoje mulher quarentona

Me permito minha própria reescrita

Sem tanto segredo

Sou a realização dos sonhos daquela menina

Sem tantos medos, sem chaves secretas

Me escrevo e simultaneamente me publico

Meu diário eletrônico, amigo na madrugada

Fiel na escuta, aceita meus sonhos

Partilha meus devaneios

Não me preserva

Me sabe artista

Minha ribalta de vidro onde desfilo mil mascaras

Autora, Atriz ou simples personagem

Sou incógnita a mim mesma indecifrável!


Instantes de Glória

O que é a vida?

este constante porfiar...

o ir e vir... pensar, sentir

querer e desdenhar

O ínfimo momento... fagulha de tempo

O tempo de um beijo na face rosada

O respirar da Pequena Natália Sofia

O contemplar... minha filha que dorme!

Que outro sentido pode ter a vida?

Não me preocupa a rima, tão pouco se há métrica!

Só brinco com as palavras...

Contemplo a existência!

Guilherme e Natalia...

Meus filhos... meu instante de Glória

Minha eternidade

Minha vida para além de mim.


Hoje acordei bem cedo

Não sem motivo

Arrumar a roupa

Passar o café

Desejar boa sorte ao meu filhote

Antes que nasça o sol lá vai ele

O meu Guigo

Black alinhado

Mochila às costas

Passo firme

Sorriso largo

Só quem conhece de perto o meu menino

Compreenderá o valor literário

Desses versinhos de rimas quebradas

Que seja este um dia de vitória filho

Que a Mãe Maria siga a frente

Que o Pai Altíssimo

Diga amém!


Dobraduras!

Minha filha Natalia Sofia em sua inocência

Dobra, amassa, redobra uma folha de papel sulfite...

De repente ele surge disforme com voz disfarçada

é o Bicho Papão!

Vem me surpreender nas pontas dos pés!

a dobradura que fala

meu falso espanto

minha cara de medo,

Seu sorriso de encanto

Lá se vão muitas outras tantas folhas

No mágico dobra e redobra

coelhinhos, flores, borboletas, lobos porquinhos com casinha e tudo

Assim como as folhas me dobro e redobro,

Ora mãe que se faz criança

Ora criança que voa em seu tapete mágico.

Entre risos e espantos

no dobra e redobra

a folha vai perdendo o seu branco

do borrão de cores

uma verdadeira epopeia se forma!


A mim encanta

A mim encanta esse "negócio de datas especiais"

Não a troca de presentes que alimenta o Capitalismo

Mais o pretexto "do dia especial"

Permissão para manifestar gratidão!

Em 1º de Janeiro tem a Confraternização Universal

Mas aqui a gente se abraça mesmo é no Carnaval!

8 de março é dia de luta das mulheres

Respeito, Flores e chocolate não podem faltar

Bom mesmo seria riscar do calendário o 1º de abril

Falando a verdade sobre as desigualdades sociais

Indo direto ao 1º de maio celebrar o dia do trabalhador

No Segundo Domingo não precisa nem falar

Mãezinha, esteja na terra ou no céu só quero te amar

Com Rezas, danças e quentão saudamos os Santos

Em Julho tem o dia 20 do amigo e do meu aniversário

Agosto é ainda mais especial com destaque aos pais!

Aí vem o dia das crianças, de N. Senhora e do professor

Depois dos dos mortos e da Proclamação da República

E por fim, não mais importante, tem o Natal!

Ano novo e começa tudo de novo!


Versos de luta

Hoje eu quis juntar umas palavras

Compor uns versos

Não quaisquer versos (embora verso nenhum seja qualquer)

Se darei conta... me digam os(as) camaradas!

(Vamos combinar que isso de os(as) é coisa que enfeia o poema)

Falarei então ora no feminino ora no masculino tentando seguir a rima)

E não são poucas as aqui homenageadas

Mulheres e Homens no sentido Maiúsculo da palavra

Professores e Professoras, colegas, irmanados numa mesma luta!

Em defesa de uma Educação de Qualidade

Em defesa de condições dignas para exercer o seu trabalho

Trabalho que é mais arte que labuta

Estes professores e professoras de que falo

São ao mesmo tempo Mestres e alunos

Aprendem e ensinam a cada nova aula.

No fronte em que nos encontramos hoje

Já não somos milhares

Somos uma só categoria

Quiseram nos dividir por áreas de conhecimento

Humanas!?

Exatas!?

Códigos e linguagem!?

Que nada!

Nem a,b,c... Efetivos, fs. Os!?

Somos Professores do Estado de São Paulo!

O que nos torna dignos de homenagens?

(Se não bastasse sermos professores!)

Temos coragem!

Empunhamos nossas armas

Que não são feitas de aço letal

A principal delas vem do calcário retirado das rochas sedimentares

A segunda, não menos importante

Provém da madeira, é fibra de celulose

Nosso lugar comum é o chão das salas de aula

Lugar sagrado (mesmo pra quem é ateu)

Que há muito vem sendo profanado

Por aqueles que se dizem responsáveis

Senhores partidários de uma ideologia de massa

Ideologia capitalista de mercado

Que faz de nós escravos

Nos negando o justo salário

Fazendo do nosso aluno

Um mero cliente!

Numero pra preencher as vagas de peão de fábrica,

Vendedora de bolsas e sapatos,

Atendentes de telemarketing

Papagaios gerúndios (que estarão atendendo)

Os doutores formados nas escolas privadas!

A ISSO GRITAMOS NÃO!

Queremos para os nossos alunos

Direitos de cidadãos

Moradores das periferias

Filhos da Classe trabalhadora

Salas de aulas menos lotadas

Mais que giz, lousa e caderno

Queremos ensino de qualidade!

Por isso entramos em greve!

Tomamos as praças

Paramos as ruas!

(me emocionei)

Paro por aqui sabendo o quão ínfimas são essas frases

Arremato com uma palavra de ordem


Lutar é preciso

O melhor refúgio é a poesia

Nasce do pulsar do coração

Alimenta-se de lembranças, medos, expectativas

Às vezes parece até fria

Quando transpira nostalgia

Vem a lágrima sempre quente derreter o gelo

Inundando meu ser

Não sei se mergulho

Se fujo ou me deixo boiar

Mais que versos de rimas quebradas

A frieza da noite pede compaixão

(Tem gente que não está em uma cama quente)

Empatia que faz doer em mim a dor do outro

O próximo que tenho que amar como a mim mesma

A ele minha oração, minha ação militante

A mim uma taça de chocolate quente

Aquecer o corpo

Esperançar a Alma

Apesar de Temer

Amanhã há de ser outro dia!

A mim encanta...

Lutar é preciso!





Pós Graduanda em Arteterapia

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